segunda-feira, agosto 25, 2003

Vida simples

Me lembro perfeitamente da minha mãe contando as estórias de quando era adolescente e estudava junto com os irmãos.
Eles viviam em uma pequena cidade do interior e estudavam em um colégio interno em uma cidade próxima, pouco maior do que a deles.
Era natural para todos os seis irmãos (contando a minha mãe) que rolassem alguns preparativos durante o período das férias, afinal de contas, eles passavam longos tempos sem botar os pés em casa e tinham que se virar de alguma maneira para cobrir todas as necessidades que tinham.
A volta para casa era sempre muito comemorada, mesmo que fosse apenas um feriado prolongado.

O mais legal das estórias da mamma não tinham muito a ver com as aulas ou com os professores. O legal era ouvir o que eles faziam nas férias.

Meu avô tinha uma pequena propriedade onde criava alguns animais e brincava de fazer vinho. Eu mesmo cheguei a pegar uma das “cerimônias” de esmagamento de uvas com os pés em uma enorme tina de madeira. Coisa fina!

Mas voltando à minha mãe e seus irmãos...
Eles tinham o costume de fazer mutirões para fazer geléias, doces e outras guloseimas que pudessem levar para o colégio interno e sentir um pouco menos de saudade de casa.
Não me lembro bem quem fazia o que, mas sei que existia ao menos um responsável por descascar as frutas, outro por preparar as panelas e ainda outro por mexer o caldo até atingir o ponto certo da geléia.
Os produtos da atividade familiar variavam de geléias de amora, ameixa, pêssego e uva, até doce de leite, leite condensado e queijos frescos. Tudo muito natural, tudo muito gostoso e puro.

A simplicidade com que eles viviam o período das férias era sensivelmente diferente do que estamos acostumado a ver hoje em dia. Naquela época não havia Internet, TV a cabo, Playstation 2 ou Revista VIP. Sei que para muitas pessoas que conheço, essas “maravilhas culturais” são imprescindíveis, mas para meus velhos tios não significavam nada. Menos que isso até.
Para eles, o mundo terminava depois de 40 minutos de viagem de ônibus e o máximo em emoção era catar camarões de água doce em riacho pedregosos e rasos. Eu mesmo experimentei essa última brincadeira e posso afirmar que dá para curtir um bom par de horas sem pensar em nada.

Meu pai também teve sua parte de estórias “de interior”. Uma grande cicatriz na perna direita está aí para provar isso. O velho não era nada bobo, não.
Vai saber que coronel foi responsável por esse corretivo??

Mesmo que alguns cientistas chatos e bitolados venham me dizer que uma coisa nada tem a ver com a outra, gosto de pensar que esse gosto pela simplicidade é uma coisa hereditária.
Nunca participei da elaboração de geléias para o colégio interno, mas acho que me sentiria muito bem se tivesse meus irmãos me acompanhando nessa.
Deve ser por isso que os olhos da minha mãe brilham sempre que ela conta essa estória.

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