Por que casar?
Sempre gostei de admirar igrejas.
Talvez isso tenha a ver com fato de um nunca ter sido obrigado a freqüentá-las por conta dos pouco efetivos compromissos religiosos típicos da infância das crianças latinas.
Minhas idas à “casa de Deus” eram bissextas e sempre estavam envolvidas por um certo desconforto por desconhecer os rituais e as respostas aos pronunciamentos do padre. Eu sempre abria a boca è esmo e tentava adivinhar o que as outras pessoas diziam.
Esse “concurso de imitação” rolava sempre que eu era surpreendido por uma missa ou casamento, mas mesmo nesses momentos solenes eu não perdia a oportunidade de olhar para os vitrais, as estátuas e os altares que estão espalhados nesse tipo de lugar.
Sou capaz de ficar o tempo inteiro olhando pra cima procurando por cores diferentes e por motivos para aqueles desenhos estarem lá. É claro que poucas igrejas têm algo parecido com a Capela Sistina, mas eu consigo me divertir bastante até em capelas com meia dúzia de banquinhos e nenhum genuflexório.
Para quem não sabe que diabo é isso, aqui vai a luz do meu conhecimento: genuflexório é aquela madeirinha baixa onde a gente se ajoelha para rezar ou onde a molecada passa quando quer se livrar dos pais durante os casórios.
Esse meu afastamento das coisas da igreja deve ficar bem claro para que não seja confundido com falta de fé ou falta de crença no divino. Eu acredito em Deus, mas não na igreja e nos seus rituais de obrigação e punição. Prefiro uma conversa mais direta e menos rancorosa com o Chefão.
Tudo estava indo bem na minha vida sem igrejas até o dia em que fui convidado para um casamento em uma certa igreja na Rua Maranhão. Acho que era o enforcamento de um ex-cunhado e por isso não tenho a situação muito clara na memória.
Devo ter ficado o tempo todo olhando para os vitrais e dando pouca bola para as peruas empetecadas e para a antipática da minha ex-cunhada entrando e saindo da igreja. Isso certamente aconteceu ao longo de toda a cerimônia.
Outra coisa certa foi a minha surpresa quando os noivos foram trocar alianças e uma chuva de pétalas caiu em cima deles. Pode parecer brega, mas valeu a pena deixar de olhar os vitrais e olhar para frente, para variar um pouco.
Na verdade é bem brega, mas ainda assim curti muito aquele lance. Gostei do efeito simples, algo como uma benção física para a cerimônia espiritual.
Os noivos saíram da igreja com algumas pétalas perdidas no meio do arranjo de cabeça e do exagero de gel e eu fiquei lá pensando que talvez o casamento não fosse algo tão esquisito assim. Parece que eu havia sido convertido sem perceber. Foi covardia.
À partir daquele momento larguei mão de achar que casamento rima com morte ou com escravidão. Parei de achar que tinha que viver tudo o que podia antes de me amarrar por que depois não haveria espaço para isso. Deixei de lado a necessidade quase predadora de dormir com 100% das mulheres que cruzavam a minha frente e faziam meus hormônios saírem da latência.
Obviamente isso não aconteceu de uma hora para a outra, mas as tais flores caindo do teto acabaram significando uma espécie de virada.
Depois desse episódio existiram relacionamentos, namoros, casos, transas, mas nenhum plano sério de andar naquele corredor estreito, decorado por flores, com gente dos dois lados e com flashes estourando a cada cinco segundos.
Tive que apelar para a importação de um tesouro das Minas Gerais para mudar esse quadro.
Tive que ampliar horizontes para aumentar minhas chances de escutar a música que foi tocada no enterro do meu avô materno, Ave Maria, durante as bênçãos aos amigos que estiverem chorando enquanto fico fantasiado de pingüim lá na frente.
Acho que isso responde a pergunta do título: uma das boas razões para e casar é para ter rosas caindo do teto sobre a minha cabeça.
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