terça-feira, setembro 16, 2003

Injustiça – Parte 1

Conheço um cara que teve a oportunidade de viver uma grande estória de amor e jogou tudo fora por que não soube balancear as importâncias de algumas pessoas dentro da sua vida.
Explicando um pouco melhor: ele fazia parte de um grupo muito unido de amigos, daqueles que só não dormem juntos por que acham que isso é coisa de viado, mas que poderiam pensar seriamente em se jogar na frente de uma bala para proteger o outro.
Talvez a metáfora da bala seja meio exagerada, mas acho que deu para entender a idéia.

Pois bem, esse cara que mencionei estava solteiro há mais tempo do que ele gostava de se lembrar. Da última namorada ele só tinha a infeliz lembrança da impossibilidade de fazer parte da vida dela: ela simplesmente não deixava e o largou quando a situação ficou insustentável.
Ele não ficou muito tempo lambendo as feridas, mas teve que se contentar com companheiras fugazes e/ou desinteressantes. Nenhuma delas tinha a doçura, o sorriso e o bom humor que ele buscava.

Foram precisos dois casamentos para que ele encontrasse uma esperança de felicidade.
Ambos foram de amigos muito queridos, mas a diferença das situações acabou significando muita coisa depois.

O primeiro casório não foi dos mais tradicionais: rolou em um buffet, com direito a benção e palmas tendo que equilibrar os sanduíches de carne louca e os canapés de salmão.
Na mesma mesa que ele estavam todos os outros amigos que encararam com ele os anos duros daquela bendita faculdade. Naquela época todos estavam acompanhados e ele era a única ovelha negra do grupo.
Como era de se esperar, as moças começaram a sugerir nomes de amigas que poderiam ser apresentadas.

Uma das sugestões envolvia uma moça que vivia uma relação de vai e vem com um cara que ninguém suportava, um verdadeiro mala sem alça.
A colocação de que ela seria garantia de dor de cabeça por gostar de tipos como aquele fez com que a própria idealizadora desistisse da idéia ainda no ninho.
Restavam mais duas moças na mesa e cada uma pensou muito na sua sugestão antes de torná-la pública.

Primeiro falou aquela que devia ser a única casada da mesa.
Havia uma menina que poderia ter o perfil do pobre abandonado, mas parece que ela era mais velha e muito mais rica do que todos na mesa. Isso não o agradou muito e ele preferiu ouvir a descrição da última pré-candidata antes de seguir qualquer caminho.

Essa terceira menina parecia ter uma quantidade razoável de qualidades: descendente de italianos, boa filha, apreciadora de atividades familiares, esportista, profissional dedicada e muito calma no que se refere a homens e adjacências.
Ela já havia namorado um amigo do casal, mas antes que ele pudesse dizer algo em reclamação, os noivos chegaram para bagunçar a mesa, distribuir abraços e matar o assunto.
Somente no evento seguinte é que ele pôde voltar a falar no assunto.

Na verdade, ele teve a oportunidade única de fazer muito mais do que falar: como era o casamento do mesmo casal que colocou a última sugestão no casamento anterior, a tal moça estava lá e começou a despertar o interesse do rapaz.
Infelizmente ele recebeu uma ducha de água fria quando ela não desgrudou de um outro convidado. Mais tarde se descobriu que era ele que não dava sossego, mas aí ele já tinha parado de observá-la e estava concentrado em fazer seus amigos rirem.

Foi preciso uma “armação” dos recém-casados para que algo acontecesse.
Ele pouco se lembrava do que tinha visto no casamento, mas a reconheceu no mesmo instante em que a viu entrando no salão daquele bar da Zona Oeste. Ela estava menos arrumada e talvez por isso ele tenha prestado ainda mais atenção aos detalhes.
Seu sorriso era mesmo aberto e suas mãos não paravam de se mexer.
Apesar esforços em descobrir assuntos para explorar, ela demonstrou uma deliciosa timidez e preferiu conversar mais com a parte feminina do casal.

Na hora de ir embora, o destino fez das suas: estava garoando e os carros de ambos estavam no mesmo lugar. Como bom cavalheiro que era, ele ofereceu seu guarda-chuva e ela chegou mais perto dele. Não era um proximidade que permitisse o roubo de um beijo, mas já era um avanço.
No estacionamento ele pediu os dois carros e também o telefone dela, que sorriu e soletrou uma quantidade enorme de números.
Ele anotou tudo direitinho, a colocou no carro, entrou no seu e a seguiu por algumas quadras.
No momento em que iam se separar, ela desferiu o golpe mortal: soltou um “me liga” e jogou um beijo para o ar. Por pouco esse beijo não causa uma batida.

Continua...

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