sexta-feira, outubro 10, 2003

Doutores

As personalidades de ambos podem fazer com que um desavisado acredite que eles vivem em eterno conflito. Um primeiro olhar sobre a forma como eles conversam pode levar a crer que o contato físico na intimidade chega a socos e pontapés.
Com relação a este casal, nada poderia estar mais longe da verdade.

Ambos são médicos, se conheceram na faculdade, estudaram juntos e se apaixonaram em meio a cadáveres, festas-monstro, garrafões de pinga esvaziados no gargalo e viagens paradisíacas.
Resolveram seguir especialidades distintas e hoje sofrem para se encontrar nos intervalos dos plantões e cirurgias.
Me parece que isso está bem adequado já que dificilmente alguém de fora do meio poderia levar na boa uma ligação de emergência às três da manhã ou um bip bem no meio do mais gostoso “rala e rola” do mês.

Vivi a parte final do namoro, pouco antes da brincadeira ficar mais séria e eles chegarem ao final do corredor da Igreja do Calvário.
A cerimônia foi muito legal e a festa melhor ainda. Me diverti muito com eles. Estava no meio dos amigos que são quase da família.

Minhas conversas com ambos sempre foram muito animadas e acho que eles também sentem que temos uma ligação quase sanguinea.
O fato dela ser irmão do meu “quase irmão” tem muito a ver com isso, mas no íntimo eu sinto que não é só isso. Sinto que temos um relacionamento especial e que todos nos importamos muito com o bem estar uns dos outros.

Tivemos muitos momentos tragi-cômicos e talvez o mais marcante deles tenha sido um certo Reveillon em Floripa: eram passados uns poucos minutos do novo ano e chuva caía torrencialmente sobre nossas cabeças alcoolizadas.
A decisão de ir embora da praia veio meio de repente e a separação do grupo acabou sendo “fatal”: ao correr para tentar alcançá-los, tropecei e caí de frente, colocando as mãos para amortecer a queda.
Até aí tudo bem, se não fosse o pequeno detalhe da garrafa de cerveja na minha mão direita: não tive reflexo de largá-la e quase consegui dar um gole antes de me quebrar todo.
Poucos minutos depois estávamos todos no pronto socorro para tentar um atendimento. O doutor estava voando por instrumentos e preferiu não entrar. Coube então à doutora a tarefa de tentar costurar a minha mão que exibia um vermelho-sangue bastante vivo (e dolorido).
Pensando no estado etílico dela, até que a cicatriz em zigue-zague que tenho hoje não ficou tão ruim.
Acho que teria sido muito pior se eles não estivessem lá comigo.

Com o doutor as coisas acontecem de uma forma um pouco diferente; Nosso negócio é secar garrafas de tequila e/ou de grappa miel sempre que vamos ao Tranvía ou a algum bar que não ofereça muita coisa além de boa bebida.
Ele sabe que sempre pode contar comigo quando precisa de um companheiro de bebida.
Infelizmente eu não agüento nem metade da capacidade do “tanque” dele, mas o que vale é o espírito de colaboração e alegria que pinta quando os destilados batem e sobem.

É por essas e outras que eles certamente estão nas primeiras posições entre os meus casais favoritos. Poucos convivem tanto comigo e poucos tem a opinião tão respeitada por mim.
Espero que a desejada (ao menos por nós, os amigos) vinda do(a) herdeiro(a) não mude a rotina do nosso relacionamento.
Torço para que ele continue sendo meu companheiro de destilados, meu cozinheiro favorito e meu amigo de fé.
Torço também para ela siga sendo minha parceira na academia, minha colaboradora nos eventos e minha incentivadora nos projetos.
Torço para que continuemos tão próximos quanto somos hoje.
Afinal de contas, é para isso que serve a família, né?

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