Me lembro de sair correndo no aeroporto, cheio de bagagens penduradas no corpo e descabelado como sempre. Meu pai estava lá do outro lado do corredor, as paredes pareciam todas brancas e as pessoas haviam desaparecido. Eu corria para abraçá-lo já que não o via há alguns meses. Era meu pai que estava lá, o velho, o grande homem, e eu lá, pequeno e cabeçudo, estava enfrentando tudo para chegar perto dele.
Ele chegou a se abaixar e abrir os braços para me receber, mas alguma coisa deu errada e eu tive que voltar. Minha mãe estava me chamando e um homem de terno escuro estava bem atrás de mim.
Demorei um tempo para entender que a gente, eu, minha mãe e minha irmã pequena, precisávamos conversar com outros homens de terno escuro antes de nos encontrarmos com meu pai. Cheguei a pensar que eles eram amigos dele, mas a falta de sorrisos me fez mudar de idéia: meu pai vivia sorrindo e não podia ser companheiro daqueles homens de terno.
E eu nunca o havia visto de roupa escura em todos os meus cinco anos de vida!
Meio decepcionado com o mundo, eu parei e voltei para junto da minha mãe.
Ela estava toda atrapalhada com a minha irmã no colo e alguns papéis coloridos acabavam caindo no chão. Cheguei a pensar que ela estava trocando algumas figurinhas com o homem na casinha de vidro, mas perdi um pouco o entusiasmo quando me vi em um daqueles papéis coloridos. Eu estava com a roupa de missa que coloquei para tirar retratos e finalmente entendia a razão de toda aquela produção. Até de cabelo penteado eu estava!
Passou um bom tempo até que os homens nos deixassem passar e ir até onde meu pai e o amigo dele estavam. Eu não conhecia o outro homem, mas como ele não estava de terno e tinha um belo bigode, não tive dúvidas sobre a possibilidade de confiar nele.
Finalmente eu podia correr, bater as sacolas do lado e quase tropeçar para conseguir abraçar meu pai. Ele abriu o sorriso costumeiro e me levantou no ar, quase derrubando meus papéis coloridos e minhas sacolas.
A barba dele me espetou, mas eu achei o máximo. Era exatamente daquele jeito que eu me lembrava dele e era assim que eu o encontrava de novo.
Abracei o amigo dele também, enquanto minha mãe chegava e meu pai a beijava. Minha irmã também recebeu um beijo carinhoso na testa e eles começaram a colocar a conversa em dia.
Falaram de parentes, de comida, de televisão e até de trabalho. As coisas não andavam muito boas lá do outro lado do avião, mas eles não pareciam preocupados com nada. Estávamos novamente juntos e nada podia dar errado.
Meu pai tinha um bigodão e isso o aproximava muito da minha visão de um super-herói, de um cara muito poderoso. Era uma versão moderna do Sansão.
Minha surpresa continuou quando saímos do aeroporto do carro e pensei mais de uma vez no que mais aquele amigo rico do meu pai poderia ter em casa, já que ele tinha um carro tão grande o bonito.
Ter esquecido de verificar aquilo não era tão surpreendente já que a chegada à casa do amigo do meu pai me fez lembrar a minha última festa de aniversário: todo mundo estava batendo palmas e sorrindom, igualzinho aos meus tios quando vinham me abraçar e me entregar presentes.
Eu ganhei muitos abraços, mas acabei me cansando de esperar pelo presentes e fui logo procurar o braço do meu pai e a mão da minha mãe. Apesar de amigos do meu pai, aquelas pessoas eram estranhas e demorei para me acostumar a elas.
Passamos a noite naquela casa de esquina e poucos dias depois fomos para uma casa muito parecida, ali do lado, onde começamos a arrumar nossas coisas e onde muitas aventuras me esperavam.
Demorei para descobrir que os meninos daquela rua não falavam nem se vestiam do mesmo jeito que eu, mas isso é outra história.
Uma forma simples de comemorar os 30 anos de Brasil da minha família.
Olhando o meu lugar hoje, só posso agradecer àqueles homens de terno escuro, que me deixaram abraçar meu pai e viver naquela pequena rua de paralelepípedos.
Meu agradecimento tem nome, mas por aqui, prefiro chamá-la de minha mineira.
Que venham outros 30 anos, Patropi! E que venham outras correrias em aeroportos.
Sem comentários:
Enviar um comentário