domingo, maio 21, 2006

Aprendizado

Eu ainda estava no meio do meu Tony Parsons quando um colega de trabalho chegou meio de sopetão me trazendo um exemplar de O Monge e o Executivo.
Eu já havia escutado muita coisa sobre o livro e até já o havia pedido emprestado para o Professor, mas nunca havia conseguido tê-lo em minhas mãos para ver o que o tal James Hunter tinha a dizer.
Não me lembro se fui eu ou ele quem citou o livro pela primeira vez, mas sei que eu estava ligando meu computador em uma sexta-feira fria e preguiçosa quando ele chegou, me entregou o livro e me perguntou se eu conseguiria lê-lo no final de semana.
Fiquei sem jeito de dizer que estava lendo outra coisa e que certamente não conseguiria me dedicar ao Monge na próxima semana, mas o cara foi tão generoso e sorridente que acabei aceitando o livro e pedindo um perdão silencioso ao Parsons.

Li o livro, pensei um pouco e concluí que o marketing é mesmo uma coisa abençoada. Somente isso explica o fato de um livro escrito sem nenhum brilho e que recicla um monte de coisas ditas muito tempo antes por outras pessoas, acaba sendo adotado como bíblia comportamental por um monte de gente.
Provavelmente isso já rendeu até teses e cases em pós-graduações e cursos de extensão.
Não me considero uma sumidade em termos de cultura ou ciência, mas já li coisa muito melhor e nem pagar eu paguei.

Isso me fez lembrar da experiência morna que tive com o Zig Ziglar e do certo arrependimento que sinto ao ter indiretamente sugerido que a minha mineira comprasse um livro dele. Mas isso já passou e não há muito o que fazer.
Só espero que ela aproveite alguma coisa da leitura.

Uma das poucas coisas que achei originais no livro diz respeito ao reconhecimento público e à repreensão privada. Experimentei a primeira parte disso há poucas semanas quando fui homenageado pela Diretoria da empresa por conta dos meus esforços em um projeto micado desde o berço.
Bem ou mal, eu consegui levantar um pouco o "abacaxi" e hoje conseguimos manter o nariz fora d´água, apesar dos pesares.

É difícil dizer o que senti quando meu nome foi mencionado e o chefe do meu chefe me chamou lá na frente.
Sempre gostei de me imaginar em situações heróicas, tipo salvamento da mocinha, mas fiquei visivelmente desconcertado na hora de emitir um simples agradecimento.
Me lembrei do chinesinho na frente do tanque na Praça da Paz Celestial, do povo batendo panelas em Buenos Aires e dos "parentes" tomando jatos d´água nas costas durante as confusões em Santiago.
Apesar da pieguice da cena, me senti meio herói, mesmo que se tratasse apenas de uma homenagem simbólica, sem maiores efeitos para a minha conta bancária e o meu cargo.

Isso me faz pensar em um determinado colega que já taxei de mau caráter pelo péssimo costume de ser o último a pagar a conta do almoço, só para aproveitar os centavos remanescentes de troco dos outros colegas.
Esse mesmo cara acha correto sonegar imposto de renda e recorrer de uma multa que ele mereceu levar, mas não é bem disso que eu quero falar.
Eu o considero um ladrão em espírito e isso só aumentou quando eu mencionei o prêmio e ele me perguntou quanto eu havia ganho nisso.
Não consigo me lembrar da reação dele, mas certamente os pensamentos devem ter passado por algo parecido com "prefiro a minha parte em dinheiro" ou coisa que o valha.

Obviamente não quero ser ingênuo a ponto de dizer que só trabalho pelo prazer.
Isso seria ótimo, mas só se encaixa na trajetória profissional da minha mineira e de outras pessoas que amam o que fazem.
Como eu apenas gosto, admito sem vergonha que trabalho também pelo dinheiro e que esse tipo de elogio e premiação atende apenas uma parte das minhas necessidades.
É preciso mais e é isso que eu vou ter.

O que me leva de volta ao Monge e às citações de Maslow e sua pirâmide de necessidades.
Neste momento, minhas necessidades são de paz de espírito e de um regime.
Não preciso mais do que isso para viver bem e fazer a minha mineira feliz de novo.
Acho que estou meio em falta com ela nesse aspecto e tenho que abrir o olho.
Talvez uma das boas formas de fazer isso seja encarando mais um "guia" comportamental / financeiro.
Vamos ver o que o Senhor Cerbasi tem a me dizer e vamos ver o que disso eu posso passar para a minha mineira.

sábado, maio 13, 2006

Objetivos

Antes de me tornar um homem sério, leia-se, me casar, meus planos de futuro se resumiam a economizar para comprar ou trocar de carro e ter dinheiro suficiente para tomar chope com os amigos duas vezes por semana e visitar Floripa duas a três vezes por ano, de preferência não no Reveillon.
Eram planos simples para uma vida simples e eu não sentia necessidade de complicá-los em nenhum aspecto.
Aquilo era toda a minha vida e eu estava feliz.

Não dá para dizer se foi o casamento em si ou o fato de ter uma pessoa realmente dependendo do meu suporte, mas depois que começamos a correr atrás das coisas do casório, minhas perspectivas de vida passaram a ser muitos mais longas e elaboradas.
É certo que a impossibilidade de visitar Floripa ajudou muito, mas também preciso dar o braço a torcer e admitir que meus próprios interesses mudaram sensivelmente.
Eu já não queria mais depender apenas de mim para elaborar e concluir meus planos. A idéia agora era fazer tudo em conjunto e aproveitar o benefício a dois também.
Nessa linha de planejamento coletivo, traçamos alguns objetivos que batizamos de plano trianual. O nome original era plano trienal, mas acabamos descobrindo que isso remetia a algo que acontecia a cada três anos e não era esse o caso.

Cada uma das nossas metas deveria ser cumprida após um aniversário de casamento.
No primeiro ano, deviamos trocar o carro, no segundo, passar 30 dias na Europa e no terceiro, comprar um apartamento maior para preparar a chegada do Labrador.
Infelizmente as coisas não são como a gente espera que sejam, mesmo que a gente se esfore muito, e nosso primeiro objetivo já teve que ser mudado logo depois de ser estabelecido.
É certo que a gente foi otimista demais e não definiu nada que fôssemos conseguir sem nenhum esforço, mas a coisa não precisava se bagunçar tão cedo assim.

Agora estamos começando a falar dos próximos objetivos e parece que vamos mudar tudo novamente. É possível que pulemos direto para a terceira meta já que a minha mineira não pára de falar em reprodução, mamadeiras e afins.
Fico até assustado com tamanho entusiasmo, mas confio que ela não coloque o carro na frente dos bois e nos arrume um problema onde só deveria rolar alegria.

Cada coisa terá seu tempo, inclusive nossa comemoração sobre as conquistas.
Basta ter paciência e matar a vontade mimando os sobrinhos.
E basta também não achar que uma demora ou um fracasso são finais de linha.
Sempre dá para tentar de novo, buscar outra alternativa ou mudar o objetivo. Nada é tão definitivo assim. E nós vamos viver isso juntos.

domingo, maio 07, 2006

30 anos depois

Me lembro de sair correndo no aeroporto, cheio de bagagens penduradas no corpo e descabelado como sempre. Meu pai estava lá do outro lado do corredor, as paredes pareciam todas brancas e as pessoas haviam desaparecido. Eu corria para abraçá-lo já que não o via há alguns meses. Era meu pai que estava lá, o velho, o grande homem, e eu lá, pequeno e cabeçudo, estava enfrentando tudo para chegar perto dele.
Ele chegou a se abaixar e abrir os braços para me receber, mas alguma coisa deu errada e eu tive que voltar. Minha mãe estava me chamando e um homem de terno escuro estava bem atrás de mim.

Demorei um tempo para entender que a gente, eu, minha mãe e minha irmã pequena, precisávamos conversar com outros homens de terno escuro antes de nos encontrarmos com meu pai. Cheguei a pensar que eles eram amigos dele, mas a falta de sorrisos me fez mudar de idéia: meu pai vivia sorrindo e não podia ser companheiro daqueles homens de terno.
E eu nunca o havia visto de roupa escura em todos os meus cinco anos de vida!

Meio decepcionado com o mundo, eu parei e voltei para junto da minha mãe.
Ela estava toda atrapalhada com a minha irmã no colo e alguns papéis coloridos acabavam caindo no chão. Cheguei a pensar que ela estava trocando algumas figurinhas com o homem na casinha de vidro, mas perdi um pouco o entusiasmo quando me vi em um daqueles papéis coloridos. Eu estava com a roupa de missa que coloquei para tirar retratos e finalmente entendia a razão de toda aquela produção. Até de cabelo penteado eu estava!

Passou um bom tempo até que os homens nos deixassem passar e ir até onde meu pai e o amigo dele estavam. Eu não conhecia o outro homem, mas como ele não estava de terno e tinha um belo bigode, não tive dúvidas sobre a possibilidade de confiar nele.
Finalmente eu podia correr, bater as sacolas do lado e quase tropeçar para conseguir abraçar meu pai. Ele abriu o sorriso costumeiro e me levantou no ar, quase derrubando meus papéis coloridos e minhas sacolas.
A barba dele me espetou, mas eu achei o máximo. Era exatamente daquele jeito que eu me lembrava dele e era assim que eu o encontrava de novo.
Abracei o amigo dele também, enquanto minha mãe chegava e meu pai a beijava. Minha irmã também recebeu um beijo carinhoso na testa e eles começaram a colocar a conversa em dia.
Falaram de parentes, de comida, de televisão e até de trabalho. As coisas não andavam muito boas lá do outro lado do avião, mas eles não pareciam preocupados com nada. Estávamos novamente juntos e nada podia dar errado.
Meu pai tinha um bigodão e isso o aproximava muito da minha visão de um super-herói, de um cara muito poderoso. Era uma versão moderna do Sansão.

Minha surpresa continuou quando saímos do aeroporto do carro e pensei mais de uma vez no que mais aquele amigo rico do meu pai poderia ter em casa, já que ele tinha um carro tão grande o bonito.
Ter esquecido de verificar aquilo não era tão surpreendente já que a chegada à casa do amigo do meu pai me fez lembrar a minha última festa de aniversário: todo mundo estava batendo palmas e sorrindom, igualzinho aos meus tios quando vinham me abraçar e me entregar presentes.
Eu ganhei muitos abraços, mas acabei me cansando de esperar pelo presentes e fui logo procurar o braço do meu pai e a mão da minha mãe. Apesar de amigos do meu pai, aquelas pessoas eram estranhas e demorei para me acostumar a elas.

Passamos a noite naquela casa de esquina e poucos dias depois fomos para uma casa muito parecida, ali do lado, onde começamos a arrumar nossas coisas e onde muitas aventuras me esperavam.
Demorei para descobrir que os meninos daquela rua não falavam nem se vestiam do mesmo jeito que eu, mas isso é outra história.

Uma forma simples de comemorar os 30 anos de Brasil da minha família.
Olhando o meu lugar hoje, só posso agradecer àqueles homens de terno escuro, que me deixaram abraçar meu pai e viver naquela pequena rua de paralelepípedos.
Meu agradecimento tem nome, mas por aqui, prefiro chamá-la de minha mineira.
Que venham outros 30 anos, Patropi! E que venham outras correrias em aeroportos.