quarta-feira, dezembro 17, 2003

Olhos verdes

Ele sempre foi um enorme paradoxo na nossa turma da faculdade.
O enorme pode ser interpretado em diversos sentidos quando se fala naquele cara.
Os anos de surfe aliados a uma genética privilegiada garantiam a posição de maior e mais forte do grupo. A justificativa do paradoxo vinha do temperamento gentil e dócil que ele tinha. Na verdade ele segue tendo esse temperamento, mas o casamento, o filho e os empregos estressantes e milionários mudaram um pouco o shape do garoto.
Uma das tiradas mais engraçadas dos tempos da faculdade é que o comparava com um touro de um desenho da Disney: o touro Ferdinando era o mais forte da fazenda e podia colocar medo em qualquer ser vivo só de olhar para ele; felizmente para os outros, o passatempo preferido do Ferdinando era sentir o cheiro das flores e dar passeios pelo campo. Uma verdadeira moça em corpo de gigante.
Era mais ou menos assim que sempre vimos aquele cara.

Além da gentileza de meninão, era a dedicação às paixões que mais chamava a atenção de quem convivia com ele.
Se não era o surfe era o Palmeiras. Se não era o Mack era a Juréia.
Infelizmente meu relacionamento com uma certa sargenta me impediu de conhecer a casa da praia, mas sei que foi lá que a vida dele começou a mudar. Fói lá que ele conheceu uma certa mulher que mudaria a sua vida para sempre e que o faria feliz por um pouco mais de tempo do que sempre.

Pelo que me lembro, ela era irmã de um companheiro de surfe dele.
Não sei bem por que ela frequentava aquela praia distante, mas certamente a comissão técnica do céu tem algo a ver com isso.
Outra coisa que está bem fresca na memória é o fato dela ter nascido com algo proibido para alguém como ele, tão cioso do respeito e do cuidado com os outros.
Para infelicidade inicial dele, ela tinha namorado!!
Não vale a pena citar o que rolou ou deixou de rolar até que eles pudessem ficar juntos sem se esconder de ninguém. O importante é que eles ficaram livres para entregarem a liberdade um para o outro.

O capítulo seguinte desta estória de amor é meio triste para mim: não pude ir ao casamento deles por que estava passando uma "maravilhosa" temporada de trabalho na minha "amada" Manaus.
Como meu desgosto por esta fase da minha vida ainda é grande, este parágrafo vai acabar depois de deixar registrado que todos os nossos amigos estavam lá para testemunhar o primeiro casamento da turma. Muitos outros vieram depois, mas o primeiro sempre fica marcado na memória de todos. Para o bem ou para o mal.

A chegada do primeiro herdeiro veio para coroar algo que já era bom.
Oivi-lo descrever a paternidade com um "legal" meio abobalhado não necessitava de tradução ou complemento. Tudo estava dito naquela única palavra.

Nunca tive certeza se ele sabia da admiração que sinto pelo que é e pelo que realizou, mas talvez esta seja a oportunidade prefeita de deixar isso para que todos vejam.
Admiro a luta que ele encarou para ter a mulher que amava. Admiro o tipo de vida que ele escolheu. Admiro a coragem de ter sido o primeiro a se casar e o primeiro a ser pai.
Admiro o brilho infantil que ainda sai daqueles olhos verdes, mesmo depois da partida de alguns cabelos, do surgimento de algumas rugas e da chegada de alguns quilos.
Admiro a alegria que sinto quando estamos juntos e admiro a possibilidade de chamá-lo de amigo.

Te admiro, bicho. Ponto final.

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